Abbey Road: a despedida em grande estilo dos Beatles




Há cinquenta anos atrás os noticiários dividiam suas atenções entre a chegada do homem à Lua, a Guerra Fria entre EUA e União Soviética, a Guerra do Vietnã, o fim da era paz e amor dos hippies... E em meio a isso tudo, mais uma bomba: Paul McCartney anunciava que estava deixando o grupo que ajudou a fundar e conquistou o mundo de maneira avassaladora havia menos de dez anos. Se os Beatles já viviam mergulhados numa crise interna que só piorava com o passar do tempo (principalmente após a morte do empresário Brian Epstein), aquele anúncio parecia ser a gota d’água: os demais membros decidiram que era o momento do grupo encerrar de vez as atividades. O sonho estava chegando ao final...



Naquele ano o quarteto havia se reunido com um quinto músico, o tecladista Billy Preston, e estavam em processo de gravação de um álbum que se chamaria “Get Back”, que visava resgatar um pouco as origens do grupo, num som mais simplificado, sem as orquestrações e arranjos que vinham acompanhando seus últimos trabalhos, buscando um rock mais direto, gravando ao vivo em estúdio com todos reunidos novamente. Mas as brigas contínuas deixavam o ambiente tóxico demais (um pouco disso tudo pode ser visto no filme documental “Let It Be”, de Michael Lindsay-Hogg). Com a decisão de acabar o grupo, os quatro músicos fizeram um acordo em deixar para trás aquele projeto que parecia estagnado e iniciar um novo álbum, que viria a ser uma despedida digna de um dos maiores fenômenos da história da música moderna: nascia ali o embrião de “Abbey Road”.



Trazendo de volta o produtor George Martin (o projeto anterior seria produzido por Phil Spector, atendendo ao desejo de John Lennon), os Beatles começaram as gravações cerca de três semanas depois de darem um intervalo às malfadadas sessões do início do ano. E a primeira música a ser trabalhada seria “I Want You (She’s So Heavy)”, baseada em uma ideia de Lennon, contando com a participação de Billy Preston nos teclados. Um intervalo de pouco mais de um mês, devido à participação de Ringo Starr em um filme, e o quarteto voltaria a todo vapor para produzir “Because”, uma das mais belas gravações vocais da história do rock, e “You Never Give Me Your Money”, uma colagem de 3 músicas inacabadas de Paul McCartney: esta mesma junto a “Magic Feeling” e “My Sweet Dreams”.

Dali por diante, uma enxurrada de clássicos foi surgindo: “Here Comes The Sun”, segundo Eric Clapton surgida numa manhã em que George Harrison acordou em sua casa e foi ao jardim com seu violão saudar o astro-rei; “Something”, também de George, em homenagem à sua então esposa Pattie Boyd; “Come Together”, surgida de uma canção tema para o guru lisérgico Timothy Leary que concorria ao governo da Califórnia; “Octopus’s Garden”, uma pérola de Ringo Starr cuja inspiração surgiu em um passeio no iate do ator Peter Sellers... e a cereja do bolo: o famoso Medley que toma conta da segunda metade do álbum, começando com a já citada “You Never Give Me Your Money” e culminando com a tríade “Golden Slumbers”, “Carry That Weight” e “The End”, passeia por diversas ideias inacabadas de canções de Lennon e McCartney, todas amarradas de maneira tão espetacular que pareciam ter sido feitas especialmente para a ocasião...



E algumas preciosidades ainda acabaram por ficar de fora do produto final: “All Things Must Pass”, de George Harrison (que aliás batizaria seu clássico álbum solo triplo) chegou a ser ensaiada durante as gravações e uma demo dela feita pelo guitarrista (bem como de “Old Brown Shoe”) apareceria posteriormente na coletânea “Anthology 3”; “Come and Get It”, composição de Paul McCartney gravada pelo Badfinger, também foi outra acabou não entrando, e uma demo com Paul executando todos os instrumentos pode ser ouvida também em “Anthology 3” – em 2011 ele acabou incluindo a canção em algumas de suas apresentações ao vivo.



Algumas curiosidades: 
- “Abbey Road” é o nome da rua onde ficam os estúdios da gravadora EMI onde os Beatles gravaram praticamente todos os seus álbuns – nome que também batiza o estúdio. E nada melhor do que estampar a capa com uma foto dos músicos atravessando a faixa de pedestres que leva à sua entrada – uma das fotos mais icônicas da história da cultura popular. 
- É até hoje o disco mais vendido do quarteto. 
- Foi o primeiro álbum da história a ser gravado em uma mesa de oito canais, uma verdadeira revolução para a época.
- Alan Parsons foi assistente de som nas gravações, e ficaria mundialmente conhecido pelo seu trabalho como engenheiro de som na obra-prima do Pink Floyd “The Dark Side Of The Moon” – posteriormente criaria o “Alan Parsons Project”, com grandes êxitos no universo do rock progressivo.
- O Fusca que aparece na capa do álbum encontra-se hoje em dia no Museu da Volkswagen em Wolfsburg, na Alemanha.

Recentemente foi divulgada a existência da gravação do áudio de uma reunião dos Beatles que desmente a tese de que eles já davam como certo o fim da banda quando este disco foi lançado, onde inclusive eles planejavam como seria o próximo álbum, mas isso já é assunto para uma outra ocasião... Hoje é comemorar os 50 anos de uma verdadeira obra de arte que sintetiza tudo aquilo o que eles foram e representam para a história da música popular... Beatles 4 Ever... Para sempre e sempre...


Doctor Robert recomenda: livro "Rock In Rio"



Com mais uma edição do Rock In Rio batendo à porta, nada mais propício do que relembrar um pouco da história do maior festival de música do Brasil. E esta história é narrada de maneira bastante dinâmica e atraente pelo grande Luiz Felipe Carneiro, jornalista que hoje é mais conhecido pelo seu ótimo canal “Alta Fidelidade”, no YouTube.

O escritor pesquisou mais de 2.000 textos sobre as três primeiras edições do Rock In Rio e fez um apanhado geral de toda a idealização, preparação e execução dos festivais de 1985, 1991 e 2000. Todas as dificuldades em se contratar artistas de primeiro escalão para um país que além de se encontrar ainda em plena ditadura militar tinha fama de dar calotes (como aconteceu com The Police e Van Halen no Rio de Janeiro pouco tempo antes), intrigas políticas que quase impediram a realização da primeira edição, a transformação do Estádio do Maracanã, o sequestro de Roberto Medina... mas claro, muita coisa sobre música e os artistas também...



Através de textos deliciosamente envolventes e muitas fotos, o leitor acaba mergulhando de cabeça e vivendo (ou relembrando, para quem teve o prazer de assistir ao vivo ou pela TV) cada uma das apresentações de todos os shows realizados. Não há como não se deleitar com as curiosidades de bastidores, histórias que acabaram virando verdadeiras lendas (o camarim destruído por Freddie Mercury, a preparação física do Scorpions, a limusine exigida por Prince para ficar a sua disposição, a macarronada que Axl Rose fez questão de dividir com a equipe de trabalhadores do festival), ou viajar com frases, acontecimentos e músicas de todos os grandes nomes que passaram pelo palco naquelas edições que entraram para a história da cultura popular do Brasil.

Faça um favor a você mesmo: adquira o livro, não perca mais tempo e comece a ler, colocando pra rolar no seu som as músicas que fizeram a cabeça de milhões de pessoas que passaram pela Cidade do Rock (e pelo Maracanã) naqueles anos, e que com certeza continuam fazendo a cabeça de muita gente... É uma viagem extremamente prazerosa e sem volta... e que venha o Rock In Rio 2019!



Grandes designers do rock: Hugh Syme



Dando continuidade no resgate dos grandes artistas visuais que nos agraciaram com grandes projetos gráficos para capas de grandes nomes do rock, desta vez vamos falar sobre o canadense Hugh Syme.



Se o trabalho de Storm Thorgerson (de quem falamos anteriormente) acompanhou quase toda a discografia do Pink Floyd, no caso de Hugh Syme podemos dizer que a sua carreira se confunde com a do Rush. Syme foi responsável por todas as capas de discos do trio canadense desde “Caress Of Steel”, de 1975. A proximidade e a intimidade com eles é tão grande que ele chegou a participar como tecladista em algumas faixas do grupo: é dele a famosa introdução feita nos sintetizadores na clássica “2112”, assim como o piano de “Different Strings” (do álbum “Permanent Waves”) e alguns teclados em “Witch Hunt” (de “Moving Pictures”).



Aliás, seu trabalho com o Rush também lhe rendeu diversas indicações e algumas vitórias do prêmios Juno (prêmio mais famoso da música no Canadá): Syme ganhou o prêmio pelas capas de “Moving Pictures”, “Power Windows”, “Presto” e “Roll The Bones”, além de levar também pelo álbum “Levity” do cantor Ian Thomas. Ainda sobre sua parceria com o Rush, Syme revelou em uma entrevista em 1983 que jamais imaginaria que a banda utilizaria seu logotipo do homem estelar (“Starman Logo”) de “2112”, algo que o deixou surpreso.



Outros trabalhos notáveis do artista são as capas feitas para o Whitesnake (“Whitesnake” e “Slip Of The Tongue”), Megadeth (“Countdown to Extinction”, “Youthanasia” e “Cryptic Writings”), Dream Theater (“Octavarium”, “Systematic Chaos” e “Dream Theater”) Bon Jovi (“New Jersey”), Fates Warning (“Perfect Symmetry”, “Parallels” e “Inside Out”), Slaughter (“Stick It To Ya”), Warrant (“Cherry Pie”), Kiss (“Revenge”), Aerosmith (“Get a Grip”), Def Leppard (“Retro Active”), Queensrÿche (“Promised Land” e “Hear In The New Frontier”), Iron Maiden (“The X Factor”), Alice Cooper (“A Fistful of Alice”) e Flying Colors (“Second Nature”), além de muitos outros...




Syme estudou artes na New School of Art, de Toronto e na Universidade de York, na Inglaterra. Além das capas de álbuns que o fizeram famoso, ele também criou as capas dos livros escritos por Neil Peart (“Masked Rider” e “Ghost Rider”), e atua também em peças publicitárias, já tendo prestado serviços para empresas como Xerox, Virgin, Panasonic, Geffen, Universal Studios, Microsoft, Sony, Disney, Warner e muitas outras mais, confirmando que seu trabalho diferenciado continua reconhecido nas mais diversas áreas...

Seguem algumas das capas extraordinárias criadas por ele:














Grandes designers do rock: Storm Thorgerson



Quem acompanha música desde os tempos dos álbuns físicos, seja em LP ou em CD, antes dos tempos de internet, MP3 e streaming, com certeza costumava se conectar não apenas com a música em si, mas também com o trabalho gráfico que acompanhava um disco – capa, fotos, encartes, etc... E alguns grandes artistas gráficos do século XX realizavam verdadeiras obras de artes sob encomenda dos artistas para servirem de capa para seus trabalhos. No blog iremos revisitar alguns destes grandes nomes, começando por aquele que talvez tenha sido o maior deles.




Storm Elvin Thorgerson nasceu em Potters Bar, na Inglaterra, no dia 28 de fevereiro de 1944. Foi contemporâneo de escola de Syd Barrett e Roger Waters em Cambridge – Syd era um ano mais novo e Roger um ano mais velho. Embora ele e Roger fossem companheiros de rugby e suas mães amigas muito próximas, um outro membro do Pink Floyd é quem foi seu grande amigo na adolescência: David Gilmour (de quem futuramente Storm viria a ser padrinho de casamento).



Embora tenha sido sempre muito ligado a música, Storm seguiu carreira nas artes gráficas, e fundou no final da década de 1960 o estúdio Hipnogsis junto a Aubrey Powell. A dupla seria acompanhada posteriormente por Peter Christopherson (que anos mais tarde se tornaria um requisitado diretor de vídeo clipes). O estúdio durou até 1982 e juntos eles criaram algumas das capas mais antológicas da história da música, trabalhando para nomes como Paul McCartney (todos os álbuns dos Wings a partir de “Band On The Run”, além de seu solo “Tug Of War”), Led Zeppelin (“Houses Of The Holy”, “Presence”, “In Through The Out Door”), Genesis (“The Lamb Lies Down On Broadway”, “A Trick Of The Tail”, “Wind and Wuthering”), Peter Gabriel (os três primeiros álbuns), Scorpions (“Lovedrive”, “Animal Magnetism”), UFO ("Phenomenom"), AC/DC (“Dirty Deeds Done Dirt Cheap”), Black Sabbath (“Technical Ecstasy”, “Never Say Die”), Def Leppard (“High ‘N’ Dry”) e, obviamente, os amigos do Pink Floyd, para quem criaram praticamente todas as capas de seus álbuns desde “A Saucerful Of Secrets” até “Animals”. E muitos outros grandes nomes.



Com o fim da parceria e o fechamento do estúdio, Storm seguiu trabalhando com seus amigos do Floyd (de “A Momentary Lapse Of Reason” em diante), e fez ainda artes antológicas para, por exemplo, o Audioslave (seu primeiro álbum), Helloween (“Pink Bubbles Go Ape”), Muse (“Absolution” e “Black Holes and Revelations”), The Cult (“Electric”), Dream Theater (“Falling Into Infinity”), Rival Sons (“Pressure and Time”), além de Megadeth (“Rude Awakening”), Cranberries (“Wake Up and Smell The Coffee”), Bruce Dickinson (“Skunkworks”) e muitos mais.

Storm ainda se aventurou como diretor de vídeo clipes, tendo realizado “Owner Of a Lonely Heart” do Yes, “Tattooed Millionaire” e “All The Young Dudes” com Bruce Dickinson, “Kids Of The Century” do Helloween, “High Hopes”, do Pink Floyd, “Street Of Dreams”, do Rainbow, e alguns outros mais. Em 2003, sofreu um AVC, que lhe diminuiu a capacidade de trabalho, mas não o deteve. Storm veio a falecer em 18 de abril de 2013 de câncer (não foi divulgado qual o tipo). David Gilmour lamentou a morte do amigo, descrevendo-o como uma força constante em sua vida, tanto profissional quanto pessoalmente.



Recentemente houve uma mostra de alguns originais de seus trabalhos no MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York) e outra no The Browse Gallery, em Berlim. Já imaginou ver tantas obras que fazem parte de nosso imaginário coletivo musical e visual reunidas em um museu?

Seguem algumas das imagens mais icônicas produzidas por ele:
















Os 50 anos da bíblia "Deep Purple In Rock"

Embora só tenha conhecido de fato o sucesso em 1970, o Deep Purple já tinha uma boa história pra contar. Formado em 1966, o quinteto tra...